Rock in Rio Lisboa 2016
Regressemos ao dia 11 de Janeiro de 1985, Jacarepaguá, Rio de Janeiro. Nesse ano havia de nascer o maior festival de rock do mundo. Nesse dia, a organização estimou a presença de 250 mil pessoas, para ver actuações lendárias como a dos Queen, entre outros grandes nomes do rock mundial.
Na celebração dos 30 anos de Rock in Rio, Lisboa é palco da 16ª edição do maior evento de música do Mundo, que atravessou o Atlântico e ganhou raízes na Europa.
Num ano de celebração, o segundo dia prometeu ser pomposo e foi.
Foram 74 mil pessoas que acorreram ao Parque da Bela Vista, para ver a banda mais lendária de que há memória na história do rock.
Emocionante? … Sem dúvidas que foi emocionante…
Recorde-se que a formação original do gigante do rock, nunca pisou solo nacional e a primeira vez que tivemos a sorte de acolher um concerto de um dos membros dos Queen, foi em 1992 (já Freddie Mercury havia falecido) no Dramático de Cascais sobre o dedilhar do mestre Brian May.
Hip Hop, R&B de Fergie
Contrariando os prognósticos, o dia foi solarengo, tendo vindo a aquecer a noite.
Pelas 20H00 já a vocalista dos Black Eyed Peas estava a espalhar brasas pelo Palco Mundo.
Fergie, senhora de uma imagem arrebatadora, sabe bem como calar os mais cépticos em relação ao seu talento que em algumas actuações anteriores não foi a mais feliz.
Se por um lado a carreira da artista norte americana não é consensual no que respeita ao sucesso estrondoso que a sua base musical pautou, por outro também não podemos ser injustos – Fergie foi a primeira actuação no Palco Mundo e num dia em que a assistência estava maioritariamente concentrada no concerto de Queen + Adam Lambert, podemos dizer que a prestação foi francamente positiva.
Fergie não tem uma máquina por trás a montar um espectáculo luxuoso e iluminado como terá uma Rihanna ou Beyoncé, mas tem um grupo de bailarinos devidamente coreografados, projecções deliciosamente apelativas ao Hip Hop e R&B e um reportório que alternou entre alguns temas a solo e claro, temas mais marcantes dos Black Eyed Peas que a iriam suportar na sua actuação de sucesso.
Raramente um artista que abre as hostes do Palco Mundo consegue pôr a assistência aos saltos e a cantarolar os seus temas. Pois bem, este segundo dia, foi excepção… Fergie desafiou o público a cantar com ela e conseguiu.
Ela correu e esfregou-se pelos cenários do palco, rebolou e correu ao mesmo tempo que foi cumprimentar a assistência que lhe respondeu com os refrões do momento. Não foi espectacular mas foi surpreendente pela capacidade em quebrar um gelo inicial que, por exemplo, os Strereophonics no dia anterior não conseguiram.
MIKA, Bairro Alto, Fado e uma Mariza em Palco
Se falamos em Mika, falamos naturalmente de um concerto carregado de energia e numa simbiose quase perfeita com um público receptivo ao artista de origem libanesa que foi um excelente entertainer… apresentando sempre uma postura de diálogo com uma assistência que não conseguiu deixar de se render aos seus encantos.
Mika é um artista completo, com um passado quase nómada. Tem uma grande variedade de influências musicais, que se materializam num reportório que misturou ritmos mais dançáveis, Prince ou Metallica, música clássica ou sonoridades islâmicas provenientes do Médio Oriente.
Num mundo de comparações, Mika é homem de uma extensão vocal muitas vezes comparada a de Freddie Mercury. Excêntrico por natureza, o artista libanês, trouxe ao palco da Bela Vista um concerto fascinante em que abriria a sua actuação com “Big Girl”, “Talk About You” e porque há em carteira temas emblemáticos, “Grace Kelly”, que levou o público ao delírio.
A faceta de animador de festas do artista, concentrou em si um respeito louvável pelo público português, que recebeu com carinho a sugestão de Mika, após ter pedido um smartphone emprestado à audiência, para que criássemos um cenário de milhares de pontos iluminados pelos telemóveis enquanto dava início ao tema “Underwater” do álbum “The Origin of Love”.
Pelo meio, Mika convidaria para subir ao palco, Jorge Fernando e o filho, dois músicos de guitarra portuguesa, para apresentar uma versão inédita de uma música que haveria escrito na sua adolescência. Aproveitando a ocasião, haveria de se confessar apaixonado pelo Bairro Alto, emprestando a sua voz e esforço linguístico a alguns versos de “Meu Fado, Meu” da autoria de Paulo de Carvalho e popularizado pela fadista Mariza.
A encerrar a actuação frenética e encantadora, Mika convidaria para subir ao palco (carregando-a às cavalitas), a artista e amiga Mariza que em sinal de respeito pela deslumbrante actuação acabaria por lhe fazer uma vénia.
QUEEN + Adam Lambert
Não valia a pena profetizar e dizer que o concerto iria ser uma espécie de tributo aos Queen ou uma homenagem ao mítico vocalista, Freddie Mercury. Também Adam Lambert, nunca teve a pretensão de substituir o histórico líder da banda, antes pelo contrário, Lambert quis apenas ser um veículo condutor para uma doce memória de Freddie, que apaziguou uma dor que em mim e em milhões de fãs espalhados pelo mundo reside com o desaparecimento do eterno Freddie.
O regresso da maior banda do Mundo, sim a maior banda do Mundo (sem comparação possível e sem desmérito de uns U2 ou Muse…) foi recebida sem receios nem preconceitos, por 74 mil pessoas que vieram ao Parque da Bela Vista para um concerto histórico em Portugal.
Se todos os dias a sociedade, comungasse da experiência que foi o concerto dos Queen + Adam Lambert, no segundo dia do Rock in Rio, garantidamente as repulsas pelas diferenças seriam tão ridiculamente pequenas que não haveria sequer lugar para residirem e ai estaríamos perante um mundo que tanto verbalizamos e pretendemos ser melhor, mas nem sempre o executamos em acções da melhor forma.
Valeu a espera pela banda britânica, numa noite que se tornou numa enorme celebração aos intemporais Queen.
Gritos, palmas, chamamentos, euforia e mais adjectivos existiriam para descrever o incrível momento que se fazia sentir na cidade do Rock, segundos antes da entrada em palco de Brian May, Roger Taylor e companhia.
A abrir, “Flash Tape” levaria logo a multidão ao êxtase e para os mais atentos, muitas lágrimas no canto do olho. De imediato, sucederam-se logo, “Hero” e “Hammer to Fall”, a desbravar uma audiência faminta pelos britânicos, que entoavam religiosamente as letras e seriam o coro para Adam Lambert o resto da noite.
A solenidade prolongar-se-ia em momentos sacrossantos, como quando Brian May dá introdução acústica ao “Love of My Life” em que transformou a Bela Vista num místico lugar em que todos flutuávamos na emoção de cantar este tema (a convite de May, num português quase perfeito) em memória do mítico vocalista da banda, desaparecido em 1991, vítima de SIDA.
Outro momento emblemático da banda seria introduzido por Roger Taylor em “Under Pressure”, para muitos recordando um dos melhores temas cantado e partilhado entre Freddie Mercury e David Bowie.
É impossível não mencionar igualmente que este brilhante baterista se fez acompanhar em alguns momentos do seu filho, duas gerações em palco e na bateria, Rufus Tiger Taylor, o filho que lhe parece ter seguido as pegadas musicais.
A noite ia correndo e os temas da exuberante apresentação dos Queen e Adam Lambert revisitavam temas sensacionais como “Don’t Stop Me, Now”, “I Want it All” ou “Show Must Go On”.
Neste artigo não é possível deixar impune um rasgado elogio ao dedilhar divino de Brian May e ao excelente trabalho e mestria de baquetas de Roger Taylor – a idade não passa por quem é dono da técnica e da paixão pela música.
A encerrar e antes mesmo do encore, se calhar o momento mais celestial da actuação dos britânicos Queen, “Bohemian Rhapsody”, onde a canção é meticulosamente cantada e partilhada entre Adam Lambert e uma projecção audiovisual de Freddy Mercury, sendo impossível não referir Freddy, tal como me referia o meu pai na infância, “A Voz de Deus”.
Para encerrar a magnífica actuação, “Radio GaGa”, “We Will Rock You” e naturalmente o “We are the Champions”, precedido do sempre “God Save The Queen” que sempre finalizou as actuações desta banda memorável.
Terminadas as actuações no Palco Mundo, os sobreviventes, que ainda eram uns bons milhares, distribuíram-se pelas atracções da Cidade do Rock, onde pelas 2H30 começaria a actuar o Rei das Pistas de Dança, Carl Cox.
Fotos: Liliana Moreira