“NOS Primavera Sound” 2015
| A maratona musical mais alternativa de Portugal e uma das mais em voga pela europa fora, entrou no terceiro dia, com a turma de festivaleiros a acusar já o cansaço.
Durante os três dias da edição de 2015 do “NOS Primavera Sound”, passaram perto de 77 mil festivaleiros que de pedra e cal se fixaram no Parque da Cidade do Porto e de lá só sairiam a altas horas da madrugada.
Este terceiro dia, era o repto para o encerramento memorável desta que foi a quarta edição e que graças a parceria de sucesso entre a NOS e o PRIMAVERA SOUND, já tem datas agendadas para a edição de 2016.
Este último dia, embora com bons nomes em cartaz, não teve contudo a mesma afluência que dos dias anteriores, não obstante, que o dia tenha começado logo por primar pela qualidade nacional.
O bandido do Manuel da Cruz
Este que é um dos mais criativos artistas e com extensa actividade musical (Ex-Ornatos Violeta, tendo também integrado projectos como os Pluto, Supernada ou Foge Foge Bandido) no panorama nacional, com a sua simplicidade e inigualável simpatia, trouxe ao Palco Super Bock o seu mais recente projecto, “Estação de Serviço”.
Há por vezes um saudosismo dos verdadeiros percursores de projectos nacionais de qualidade, que nos trazem belos temas que marcaram os anos 80 e 90 e Manuel da Cruz é exemplo disso… um artista singular que constrói mundos paralelos em torno de temáticas sobre o amor e até mesmo sobre si próprio, numa improvável “fusão de fado e electrónica” que só em artistas como Rodrigo Leão, encontraremos comparação.
Durante aproximadamente 50 minutos foram apresentadas novas canções, mas foi no cancioneiro de Manuel da Cruz que se focou a actuação, revisitando alguns temas de carreira como “Ócio” dos Supernada, “Estou Pronto” dos Foge Foge Bandido assim como a efusiva “Canção da Canção Triste”, esta que foi recebida sobre um enorme entusiasmo dos presentes, sendo esta uma homenagem do público mais que merecida a Manuel da Cruz.
Recentemente a influente revista online norte-americana Pitchfork considerou este um dos melhores concertos do Primavera, rasgando vários elogios ao artista, onde o crítico de música Evan Minsker tece a feliz consideração que enche qualquer português de orgulho – “Várias das suas canções são inspiradas pelo fado, mas o uso de electrónica dá-lhes um ar contemporâneo”.
Damien Rice – Entre as bandas sonoras dos filmes e a liberdade reclamada
O irlandês Damien Rice é daqueles artistas que trazem momentos de rara magia à música e de serenidade, por vezes melancólica que herdou da sua experiência quase nómada adquirida durante um ano de itinerância pela Europa, onde tocou nas ruas… forma que assume terapêutica para resolução de alguns conflitos que necessariamente teria que resolver.
Em carteira trouxe três álbuns e muitos sucessos que se espalharam pelo mundo, um pouco à conta de temas que integraram bandas sonoras de filmes como “Closer” ou “Shrek, O Terceiro”.
A amena paz de espírito que se vivenciou no público, contrasteou com o anterior concerto dos Foxygen que havia sido de euforia enérgica. Contudo o Primavera é isto mesmo, uma variação caracterizada pela bipolaridade, que pode de um momento para o outro viajar entre a euforia (recorde-se o concerto de Belle and Sebastian) até à intensidade teatral e quase trágica dos Antony and the Johnson.
Em Damien Rice, a amenidade corresponde à música e o processo materializado na actuação do irlandês é cândido e sem lugares a euforias.
O anfiteatro do Parque da Cidade encheu-se e a tradicional toalha do piquenique serviu para gente sentada ou deitada apreciar boa música e boa cerveja, bem como um concerto que foi sem dúvida um momento de relacionamento muito pessoal e íntimo entre cada pessoa do público com o artista.
A voz cromática sussurrou sem grandes abstracções ao coração dos fãs as canções de amor como “The Box”, “Cannonball” , “Delicate”, “I Remember”, ou o aclamado tema “The Blower’s Daughter” que fez a plateia, elevar telemóveis e isqueiros.
Por altura do fim do concerto, a brisa marinha já andava a aprontar das suas, mas a máquina não parou e seguir-se-iam os concertos nos demais palcos do Primavera.
Death Cab For Cutie – O merecido concerto
Nós por cá, optámos mais uma vez por fazer algumas escolhas, e os Death Cab For Cutie, foram a escolha óbvia.
Estes que na primeira edição do Primavera Sound do Porto viram o concerto cancelado por motivos técnicos, regressaram três anos depois para consolo de seguidores lusos que nunca haviam visto os norte-americanos ao vivo em Portugal.
Este, foi um projecto que nasceu apenas com o fundador do grupo Ben Gibbard, juntando-se mais tarde os demais membros, Chris Walla (que acompanhou o projecto desde o início na produção dos trabalhos discográficos), Nicholas Harmmer e Jason McGerr.
Death Cab For Cutie têm no seu ADN a herança genética do rock que aliadas ao pop estabelecem elos com a electrónica num som que se funde, tendo contribuído de corpo e alma para a criação de álbuns como “Plans”, “Narrow Stairs”, “Codes and Keys” ou o mais recente trabalho de estúdio “Kintsugi”.
Entre a boa disposição da banda norte-americana, que já se encontrava há alguns dias em território nacional a visitar o país, e uma ou outra farpa lançada à conta do cancelamento do concerto na edição de 2012, o alinhamento variou entre temas mais antigos como são exemplo “I Will Possess Your Heart”, “Crooked Teeth” ou o mais recente álbum, “Kintsugi” (2015), “The Ghost of Beverly Drives” ou “Black Sun”!
Destaque ainda para os temas do álbum “Transatlanticism” que foi devidamente festejado pelos presentes quando tocado o tema “The New Year”!
Em boa verdade senti falta de um dos temas mais cativantes da banda, “El Dourado” a fazer-nos lembrar um pouco os britânicos Pet Shop Boys (que em boa verdade se diga, a voz de Ben Gibbard em muito se assemelha a de Neil Tennat).
Pelas 23H20, começou o início do fim e davam entrada a banda britânica Ride.
Talvez porque exista uma certa confusão generalizada entre o estilo dos Ride, ora pop ora rock, ora não o é, foi uma oportunidade para o público dispersar para outros palcos como o ATP ou tenda Pitchfork que por esta hora apresentavam o trio feminino de punk norte-americano EX HEX, projecto encabeçado pela ex-vocalista dos White Flag, Mary Timony.
Os tempos são de viragem, mas EX HEX mantem os bons fígados do punk complexo e irresistivelmente melódico!
Ora como bem tenho indicado no meu testemunho nesta que foi a segunda edição que o Jornal Dínamo® acompanhou do NOS Primavera Sound, as escolhas por vezes são difíceis, mas há que as fazer e como claramente as mesmas incidem sobre bandas que considero terem um percurso positivo ou promissor na música, era altura de me deslocar para o Palco ATP para confortavelmente me instalar e ver os The New Pornographers que entraram em palco às 00H35.
O Palco ATP é um espaço que tem como objectivo, albergar projectos promissores na música, mas que ou ainda estão numa fase embrionária ou ainda não se alargaram ao vasto espectro da música, sendo uma oportunidade de vermos novas bandas ao vivo que num festival de índole mais comercial, se calhar, não teríamos oportunidade para tal.
O facto de serem bandas novas ou não muito conhecidas do público em geral (salvo raras excepções como o caso do concerto do dia 5, dos Sun Kill Moon ou Movement, não fazem contudo estes grupos terem menor valor, muito pelo contrário… ao longo das quatro edições do NPS, o Palco ATP tem sido uma verdadeira caixa de pandora e pautado pela qualidade das propostas apresentadas.
Os canadianos The New Pornographers, oriundos de Vancouver, são praticantes de um indie com contornos de power pop onde abunda uma complexidade extremamente melódica na sua proposta musical.
Esta que é uma banda com uma carreira solidificada, apesar do interregno para projectos paralelos dos membros da banda, que quando retomaram ao activo, assumiram o seu património e influências em bandas como Big Star ou Beach Boys, tendo-se materializado no último disco “Brill Bruises” (2014).
Confesso que a minha expectativa para este concerto era alta, mas devido ao facto de estarem a ocorrer concertos no palco contíguo e alguns problemas de som fizeram da actuação dos canadianos uma certa desilusão.
No alinhamento a aposta foi variando em temas como “Brill Bruises”, “Dancehall Domine” do álbum editado em 2014 ou num regresso ao passado com trabalhos discográficos como “Together” e “Twin Cinema”, com temas como “Moves”, “Sing me Spanish Techno”, entre outros.
Pelo meio, ainda houve direito a alguma dança ao som do tema “The Champions of Red Wine” que arrancou maiores aplausos a uma banda que teve uma actuação morna, vaticinada por alguns problemas de afinação e som.
UNDERWORLD – A esculpir os trilhos da felicidade por meio da dança
E porque pela 1H30 da manha, já precisávamos de uma saturday night fever e aquecer os corpos, voltámos à base e no Palco NOS era hora dos reis da noite contrariarem o frio.
Estes que são icónicos na aurora da música electrónica, são também eles culpados pela ascensão do house progressivo mainstream.
Os sets são de uma fusão homogénea de house, pop, techno que se revigoram em explosões de energia que fizeram os presentes na actuação dos UNDERWORLD… dançar, dançar e dançar na dancefloor do Palco NOS.
O alinhamento foi rico e a motivação para o concerto foi a celebração do 20º aniversário da edição do primeiro trabalho, “Dubnobasswithmyheadman”, disco que catapultou a dupla para os sucessos internacionais.
“Dark&Long” dá o arranque à actuação que se sucedeu com temas como “Mmm… Skyscraper, I Love You”, “Surfboy”, “Spoonman”,” Tongue” (…) terminando a incursão de “Dubnobasswithmyheadman” em “Me”.
A tónica da actuação haver-se-ia transformado em lema do concerto, tendo Karl Hyde, repetido diversas vezes ao longo do concerto, “dançar é a raiz de todas as coisas boas”, finalizando com os electrizantes “Rez” e “Born Sleppy. NUXX” do álbum “Second Toughest in the Infant”.
Primavera Sound, um sucesso garantido
Encerrada a edição de 2015, e com a garantia sólida de que o “NOS Primavera Sound” é neste momento uma marca patenteada e devidamente alicerçada no Porto.
Estão já agendadas as datas da 5ª edição do “NOS Primavera Sound” 2016 para os dias 9, 10 e 11 de Junho, com um cartaz de luxo, conforme a organização já nos tem habituado.
Fotos: NOS Primavera Sound / Hugo Lima ©
Agradecimentos: Marina Reino/ Luís Gomes (NOS)